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Avenida da Marlene

Já há algum tempo que ouvia falar da chef Marlene Viera e tinha curiosidade de experimentar o seu trabalho. Oriunda da Maia tem já uma carreira longa tendo trabalhado no Porto (Degusto e Sheraton) e em Nova York (Alfama). Mais recentemente foi sub-chefe no Manifesto de Luís Baena e finalista do concurso Chefe Cozinheiro do Ano em 2011. Nestes entretantos também passou pela Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa com a qual penso que ainda colabora como formadora. Em meados de 2012 abriu o Avenue em plena Avenida da Liberdade e desde a abertura que o que se ia ouvindo levava a convidar à visita.

Avenida da Marlene - reservarecomendada.blogspot.pt

Acabei por lá ir em mais uma etapa da tradição bi-anual que eu e a Ana temos nas datas dos nossos aniversários. Confesso que não foi a primeira escolha mas esta coisa de os hotéis escolherem a primeira quinzena de Janeiro para fecharem ou reduzirem o serviço para fazerem manutenção já quase me tinha estragado um jantar de aniversário e desta vez tornou impossível a primeira escolha. Assim acabei por escolher a Avenida para almoçar no meu dia de anos.


Apesar de a entrada não se destacar muito do resto das lojas e hotéis da Avenida da Liberdade é uma surpresa quando subimos as escadas e nos apercebemos da vista privilegiada sobre a Avenida que o Avenue tem. A primeira fila de mesas junto à janela é definitivamente um local de eleição para comer. Qualquer urbano-depressivo como eu se deixará seduzir pelo ir e vir do carros no Boulevard da Liberdade. Fico na dúvida se o Avenue é restaurante de almoço ou de jantar... Por agora parece-me que a luz do dia, mesmo de inverno, beneficia a panorâmica mas continuo na dúvida.


Começamos com os Peixinhos da Horta com Maionese de Coentrada, uma assinatura da casa que imediatamente marca o conceito do Avenue, referencias do receituário tradicional português vestidas com novas roupagens. Peixinhos da Horta ainda quentes que pareciam ter replicado uma viagem que fizeram à séculos atrás. Se os levámos para o Japão, no Japão foram aperfeiçoados pela paciência e rigor japonês e foram feitos tempura. Agora nestes peixinhos da horta pareceu-me reconhecer alguma da leveza e crocante do polme fruto dessa paciência e rigor japonês.


Continuamos com a Farinheira e o Ovo é cá do Povo em que o ovo é escalfado e acompanhado por um crumble de farinheira e folhas do campo. Um prato simples e bem conseguido em termos de sabor mas a expectativa que tinha era que a farinheira estivesse crocante coisa que não acontecia. Esse pormenor acabou por não comprometer o prato mas baixou ligeiramente as minhas expectativas.


Aqui a Ana pediu uma alteração ao menu para que o prato de peixe fosse um dos pratos de espadarte da carta. Foi-lhe servido então o Espadarte Rosa com Risotto de Algas. Muito bem conseguido com o peixe no ponto e muito bem trabalhado e o risotto cremoso e irrepreenssível. Talvez se dispensasse esta deriva da matriz portuguesa para o risotto mas a qualidade do prato fazia esquecer fervores nacionalistas.


Eu mantive-se na rota programada do menu de degustação e segui com o Ensaio de Bacalhau à Brás. Aqui o bacalhau vinha em posta e era acompanhado de maneira a nos fazer recordar os sabores e texturas do bacalhau à brás. O bacalhau, provavelmente confitado em azeite, estava no ponto (e quem me lê sabe que isto não é algo que diga levianamente) e estava muito bem conseguida a referencia ao bacalhau ao brás. No geral apenas achei que precisava os sabores fossem um pouco mais intensos como um todo. Foi um prato que esteve sempre a sorrir para mim mas senti falta de umas sonoras gargalhadas.


Chegamos assim ao Leitão da Bairrada (que) ninguém esquece... e bem merece em que tínhamos o leitão assado, puré de maçã reineta e caril, molho de cabidela e chips de tubérculos. Há que fazer referencia ao empratamento, um dos mais bonitos empratamentos que vi nos últimos tempos e no que diz respeito a pratos de carne não me estou a lembrar de nenhum melhor que este. Muito bem conseguida a referencias à laranja que costuma acompanhar o leitão por via da fina rodela de laranja desidratada e às batatas fritas às rodelas por via das chips de batata doce e acho que havia por ali mandioca também. Fiquei na dúvida se o caril seria mesmo necessário embora ligasse bem com o puré de maça reineta que cumpria bem a função de contrabalançar a gordura do leitão por via de alguma doçura. A minha peça de leitão tinha, para o meu paladar, um pouco mais de sal do que gostaria sem que isso no entanto fosse comprometedor para o prato.


Terminada a fase salgada da refeição continuamos com uma pré-sobremesa, o Gelado de Manjericão. Esta baralhou-me um bocadinho pois fiquei na dúvida da verdadeira intenção. As pré-sobremesas funcionam habitualmente como limpa-palato de maneira a fazer uma espécie reset à nossa boca após pratos mais intensos em termos de sabor que poderiam contaminar os sabores da sobremesa. Os gelados à base água (sorvetes, sorbets,...) habitualmente cumprem muito bem esta função e este gelado de majericão fazia-o muito bem não deixando de mostrar alguma personalidade dada pelo manjericão. Já o pralinê (acho que seria pralinê de amendoa) que o acompanhava apesar de estar agradavelmente crocante e que ligar muito bem com o gelado não me pareceu que funcionasse como limpa-palato. Assim pareceu-me uma pré-sobremesa extremamente bem conseguida e de uma aparente simplicidade quase atroz mas fiquei na dúvida se conseguia cumprir completamente a função de limpa-palato. Como o pralinê também fazia parte da sobremesa que se seguiria talvez a ideia passasse por estabelecer já aqui uma ligação com o que estava para vir.


Terminamos com O Nosso Pastel de Nata que nos trazia um gelado de pastel de nata, espuma de canela e pralinê de amêndoa. Se por um lado eu ando a começar a ficar um pouco farto destas desconstruções de sobremesas clássicas tenho de dar a mão à palmatória e concordar que esta sobremesa estava muito bem conseguida e extraordinariamente boa. A nata em forma de gelado servia de ancora a um conjunto que conseguia evocar na perfeição o Pastel de Nata tanto em sabor como em textura. Mesmo os intrusos morangos acabavam por se integrar com naturalidade no conjunto. Conseguiu bater, na minha opinião, a desconstrução de Pastel de Nata que tínhamos provado precisamente à um ano atrás no Belcanto.


Há uma matriz que está presente quase de inicio ao fim neste menu e no resto da carta do Avenue: pratos evocativos de clássicos da gastronomia portuguesa que na carta quebram a resistência mesmo dos mais conservadores. A chef Marlene Vieira depois troca-nos as voltas e veste estes pratos em novas roupagens sem no entanto os atraiçoar e parece-me que pode ser capaz conseguir convencer mesmo os mais ferozes tradicionalistas. Gostei dos nomes dos pratos, simples, curtos, brincalhões e às vezes divertidamente enganadores. Fogem a uma tendência hiperrealista muito em voga em que se toma a descrição ou mesmo a receita como nome do prato. Há por ali uns pormenores a corrigir mas que acabam por não comprometer. De momento não luta com a primeira linha dos restaurantes de Lisboa porque pratica preços diferentes, por usar produtos portugueses de grande qualidade mas sem grandes luxos e finalmente devido à matriz mais evocativa da tradição e mais conservadora que parece pretender seguir. Tudo isto acaba por fazer com que tenha uma relação qualidade-preço difícil de bater. Agora depois de lá ter ido o que eu não consigo perceber é o nome... Se a ideia fosse fazer deste espaço um bitrô ou uma brasserie com cozinha tradicional francesa até se percebia, mas com a matriz portuguesa que têm, é como se a Avenida da Liberdade tivesse de falar francês para poder aspirar a uma espécie cosmopolitismo serôdio. Ficava-lhe bem melhor Avenida.

Cozinha para todos - www.wook.pt

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